I
É de manhã indo para o trabalho
que me sinto solitário.
É tendo um emprego que percebo
a opacidade irremediável da existência.
Já não sei bem se bebo
café ou conhaque?
Estou dormindo ou acordado?
Não percebo, percebe? se estou embriagado.
O meu problema é ter sido reduzido ao medo da chuva,
de molhar os sapatos,
à viver aprisionado.
A vida será isso?
Pela janela do carro o mundo se afigura a um quadro expressionista,
no qual as formas remetem
a tempos imemoriais
- é dessas formas que esqueço mais!
Sinto o peito de pedra irmanado ao chão.
Já chorou lágrimas de álcool?
Percebe que as nuvens são pontos, pequenos?
Tão próximos!
Já sentiu que poderia tocá-las?
Que seus cabelos podem se confundir com esse mundo de nuvens esfumaçadas?
II
Meu olho de vidro vai pela fumaça,
vê senão entende, o mundo
dessente.
Pelos olhos invento o mundo,
explico tudo o que confundo.
A que, sem fundo, tenho direito.
Julgo o mundo pelos olhos,
um estranho pela porta,
o jardim pela janela.
Jogo com as formas que esqueço.
Vidro e fumaça deforma.
Enquanto lá fora...
Vejo o monumento,
um Imemorial,
uma homenagem ao esquecimento.
Não sei se mereço tanto
por meus de-s-feitos!