terça-feira, 8 de dezembro de 2009
Ária
agudo tocando coas águas as pontas do pés,
eram árias antigas, das profundezas de cabarés,
que não lhe deixam.
Tentou me falar de lembranças que vinham do mar
de águas tão distantes, difíceis de lembrar,
mas não lhe deixam.
E não lhe deixam marulhos passados,
enterrados nos olhos profundos,
vermelhos, molhados.
Quebrou-se coas ondas de espumas brancas
desfez-se ao chocar com lembranças,
que não lhe deixam.
26-11-2009
segunda-feira, 28 de setembro de 2009
A Festa
o fim do vinho e da festa,
o silêncio da orquestra.
No momento em que chorei,
só, com minha roupa de rei,
acompanhou-me atento
o passo bêbado dum convidado;
meu próprio passo lento,
lento e cambaleado,
a bela moça, seu vestido
e seu cabelo comprido,
a beleza do bufett
que não se come, só se vê,
e o sorriso do chef.
Era tudo tão bonito!
09-09-09
quinta-feira, 27 de agosto de 2009
A mosca e o rei.
é esse servo que vos fala
deste estábulo.
Habito esta parte que outrora ganhei
de um garanhão de raça
- carismático!
Não há esforço que eu faça,
mesmo em dias tristes nos quais me perco,
que me convença a abrir mão do meu esterco.
E no bater da minha asa
para longe de casa
estercos vejo aos montes, mas
“como o lar não há nada”
minha avó já me falava.
A mosca da merda do cavalo
é, quem sabe, tudo o que serei,
mas o que importa, somente,
é que aqui posso ser Rei.
01-06-2009
domingo, 14 de junho de 2009
Sem
menos hora ia acontecer.
Ficar não adianta,
beber não adianta,
calar não adianta,
viver não adianta.
Tanto faz, mais além
quem olhar pra trás
não reconhece um palmo.
Nem um tiro de escopeta
vindo direto em sua cabeça.
Correr não adianta,
fumar não adianta,
gritar não adianta,
morrer não adianta.
Tanto faz, já que aliás
nem a frente a neblina se desfaz.
O conselho é “fique calmo,
se esconder não vale a pena.
Não adianta, tanto faz!”
11-06-2009
quinta-feira, 30 de abril de 2009
Insônia
(Para Tom Adamenas)
O corpo se perde em si mesmo,
passo-a-passo ele caminha,
quadro-a-quadro ele se move,
e os olhos colados no relógio-de-parede
contêm a extensão do dia seguinte.
Tudo se aglutina no antigo ruido
e escorre fazendo corpo com o meu.
Somos todos o mesmo sono.
Os ponteiros não param de estalar,
eles trazem o mau presságio
do fim dos tempos
que fogem do relógio.
De repente tudo é tempo.
Tudo é Nada. Nada pode ser contido.
Onde está o velho sentido?
Da fusão surgimos novos,
mas agora somos um,
o mesmo tempo ido e findo,
também o mesmo que se mantém,
o que se passara, passa e passará.
O escuro é muito grande
e dura tanto quanto o tempo.
Ele permanece sendo
cada vez mais breu
fazendo corpo com o meu.
Somos todos o mesmo sono.
Drummondiana
Os companheiros não disseram que havia uma guerra
e era preciso trazer fogo e alimento.
Depois não avisaram que ela havia terminado
e ficamos todos aqui, suspensos...
Agora buscamos por muletas
que amparem membros que não foram amputados.
A falência múltipla dos órgãos
não pode ser medicada e as bombas ainda vibram o ar
trazendo lembranças de tudo que ainda vivemos.
Ali mesmo acontece o banquete
mas nós morremos aos poucos,
por inanição, sedentos, infartados
pelo êxtase da comemoração alheia.
Admiramos as formas retas, sem expressão
que simbolizam o controle e a calma
daqueles que seguem explodindo por dentro
gozando os espólios conquistados a custo nenhum.
É tempo de homens vazios,
de homens e corações vazios.
É o tempo do Lá, do atrás daquilo...
Os maus poemas continuam por aí
e eu não me assustaria se esse fosse outro...
É preciso desconfiar de tudo
da fé cega, do pé atrás.
É preciso suspeitar do tempo.
É preciso esquecer da estória.
É preciso aquecer o conhaque.
É preciso não se comover,
esquecer o que diziam os poetas
nesses tempos de se estar
somente.
quarta-feira, 25 de março de 2009
Costura
Faço dos meus sonetos favoritos coletânea.
Deixo em vários versos teu nome sugerido no fim.
Busco calmamente o eco deste nome...
Te adapto para arte contemporânea.
Busco calmamente o eco deste nome...
Fragmento tudo o que significas pra mim.
Busco calmamente o eco deste nome...
Contemplo mudo essa beleza espontânea.
Evoco as musas para que tudo tenha um bom fim.